Cotidiano
As paredes retiveram o calor do dia
Agasalhando-me ao cair da noite
Na madrugada as janelas tornaram-se frias
Enquanto o sol voltou a nascer trazendo consigo o açoite
Ainda estou tão cansado
Em uma estrada de luz matinal
Vejo a poeira caminhar em ritmo lento
As nuvens migram procurando sua terra natal
Embaixo do chuveiro afogo todo tipo de pensamento
Calço o mesmo sapato
Os passáros cantam com energia
Mostrando que a felicidade é despretenciosa
Quase nunca agradecida
Quase nunca de proezas heroícas
Apresso o passo
Na rua ainda sem vida, tomada por um frágil silêncio
Saímos sem questionar por quê razão
Queimamos nossa vida em um imenso incêndio
Pelo calor e brilho de uma explosão
Me entrego ao cansaço.
Jaz
Uma chuva fina
Em uma noite pesada
Lâmina na linha
E uma estrela se apaga
Mas o universo é maior
Onde a luz se propaga
Preenchendo os vazios
E iluminando a escuridão.
Apuros
Teu corpo solto sobre o meu
Minha mão em teus cabelos
Palavras jogadas na tarde livre
De repente
O inesperado
Frenesi
Mãos levadas a boca
A angústia desenhada nos gestos
Atrás da porta não mais a sombra
Mas o amor
Não havia segurança
Brilha demais
Embaixo da cama não mais monstros
Mas o amor
Comprimido
E lá embaixo havia dor, planos, sorrisos
Mas não havia tempo para confissões
E nem era permitido revelar-se
Tudo seria tão complicado a outros olhos
Certamente condenados
Então fugi
Sabendo que jamais abandonara o coração dela
E que o amor ficara em cada cantinho do seu lar.
Dispersão
Desperto
No momento em que me encontro
Imerso
Em um paraíso sem dono
Inverso
Ao valor do vidro e do metal
Incerto
A tudo que é real
Despeço
De uma realidade fatal
E rezo
Pra que sempre exista um momento em que me encontre
Disperso.
Minha garota
Ela está sempre a procura de algo
Que a transforme no que agrada
Ela acha toda contravenção um saco
Pensa que tudo isso leva a nada
Eu disse: Meu nome é L.A., muito prazer
Ela diz: Meu nome é K.
Mas quanto ao prazer garoto, só ao anoitecer
Ela aponta para o céu
Tentando decifrar a sorte do dia
Ela diz: Tenho todos os defeitos L.A.
Que uma mulher perfeita gostaria de ter
Eu disse: Por favor, revele o segredo!
Ela diz: Você tem uma chave que nada abre
E essa chave chama-se desejo
Meu bem, por que não estendeu o braço?
Estive tão perto, estive quase lá
Ela diz: L.A., existe um infinito entre o quase e o fato
Que você não conseguiu atravessar
Eu disse: Seu coração está tão frio…
Ela diz: Você está enganado
Esta terra seca está sendo queimada por um rio.
Em frente ao rio
A melancolia ecoa alto em meus ouvidos
Sentado debaixo de uma árvore
Em frente ao rio agonizante
E aos gêmeos de concreto
Tão rígidos
Destoando com a natureza ao redor
Da elegância das garças
Alimentando-se da putrefação
Do arrebol alaranjado
E de algum modo
A vida se erguendo com certa dificuldade
Em meio ao caos
Barcos navegam com grande tripulação
Procurando beleza
E ainda há beleza
Dá pra acreditar nessa merda?
Tédio mortal
Estou dopado
Doses cavalares de cotidiano
Me entorpece
Vida torpe
Agora só torpor
Amanhã, novamente
A toda velocidade
Encarando a estrada ruim
Os solavancos que arremessam minha alma
Para longe do meu corpo
E se é assim… E se for sempre assim
Melhor que o espírito se desfaça do peso inútil do corpo.
Meu limite é você
Sinto que começo em mim
Mas só termino em você
E deve ser por isso essa incompletude
Quando não estás aqui
Jorro sem fim
Disforme
Não há corpo
Não há festa
A vida ganha um sentido frágil
Planos e metas
Não quero me resumir a isso
Por isso quebro ao menos um dente das engrenagens da máquina
Por isso paro de nadar um pouco e me permito boiar
Respiro, observando a vaidade nobre do mar em frente ao céu
Por isso te amo em dia branco
Pra te mostrar… Pra te dizer
Que meu limite é você.
Astro Rei
Nasce estrela maior
Nasce estrela ardente
Traz contigo um mundo claro
Me enxarca em tardes quentes
Irradia teu brilho, que é pra mim e já era pra ti
Revela o que se escondia
Tua chama que nutre em si
Rei auto-proclamado que nos pune e incendia
Ânima dos corpos
Tens a cor do amor
Expurga sentimentos noturnos e inóspitos
Abençoa-me com teu calor.
Crescer
Crescer
Nada mais que adoecer
Diariamente
Incomoda, dói
Mas o quê há de se fazer?
Só deitar, adormecer… Crescer
Até não dar mais
Até o corpo expirar
Para a alma crescer.